No parque, domingo a tarde, uma longa fila de formigas atravessava o chão perto dos banquinhos. Um guri, naquela fase detestável dos ‘por ques’, ia testando a paciência de seus pais perguntando sobre as coisas mais aleatórias. “Por que os peixes não comem barro?”(sic!). Quando viu a fila dupla de formigas – uma carregava folhas e restos de comida que o pessoal que vinha ao parque deixava, e a outra fila, rente a primeira, iam as formigas em sentido contrário, indo buscar mais folhas e restos de comida – o guri se agachou com aquele entusiasmo curioso que se perde conforme vamos passando pela escola.
- O que é isso, mãe?
- Ué, isso é formiga filho.
- Por que elas tão assim?
- É o caminho que elas tem que fazer.
- Por que?
- Por que elas querem.
- E por que essa daqui ta fora da fila? – apontou para uma formiga que não ia em fila nenhuma.
- Ela se perdeu. Ta vendo aquela outra ali, ó? É a mãe dela preocupada e procurando por ela.
- Cadê o pai?
- Aaah, hoje é domingo, o pai-formiga não ta, ele foi passear.
(breve silêncio do guri, mas como é sabido, silêncio de criança só quer dizer que ela está prestes a aprontar alguma)
- Posso matar elas!?
- Ai, filho. Deixa disso. Elas não estão fazendo mal algum, além do que...
- Toma! Tap, tap, tap - mais ou menos esse o barulho das chineladas que o moleque deu.
- Ah, filho! Não precisava fazer isso.
- Hehehe, tap, tap, tap - chineladas de novo... criança é um treco maldoso.
- Olha lá! Ta vendo aquela formiga? É mãe também, e agora ta chorando por que você matou os filhos dela...
(surge no garoto uma expressão de espanto, seria remorso se ele soubesse o que é isso e se não fosse criança)
- Mãe... por que elas não se mexem mais?
- Você matou elas, estão mortas. Mó-rreu. Babau. Agora não tem mais jeito.
- Mas elas não vão embora?
- Não filho, você matou todas.
(o guri, quieto, ainda tentou empurrar as formigas mortas para ver se surtia algum efeito, quem sabe elas voltariam a andar, mas diante do fracasso desistiu de tentar de novo)
- Manheee... – todo choroso.
- O que foi filho?
- Quero ir embora...
Acho que esse vira militante do Greenpeace quando crescer, só para dar vazão ao arrependimento.